Nazareno: Sempre tem alguém em casa

“Ele abriu os olhos,
que tinham se mantido abertos
o tempo todo,
mas só haviam visto pensamentos,
e avistou sua casa,
aninhada lá embaixo no vale”

Orlando: a biografia, Virginia Woolf

A casa da gente. Refúgio, esconderijo, reduto, ninho. Espaço que guarda memórias e devaneios, no qual habitam para sempre aqueles que por ali passaram. Espaço que sabe as verdades que carregamos, espelho do que de fato somos. É verdade, como diz Nazareno, que “sempre há alguém em casa”, seja este alguém presença ou ausência. A frase dá nome à exposição do artista, em cartaz na galeria Lume, casa das obras de Nazareno nesta temporada e reflexo de suas descobertas enquanto habitou a sua própria nos últimos anos.

Nazareno interessa-se pelas relações que conformam este espaço doméstico de intimidade. Por lá, encontra as histórias que relata em suas obras, recria situações, diálogos e também gestos, desenhados e gravados em louças, taças, rodapés e espelhos. Gosta do jogo subversivo que ocorre nos lares mundo afora, que são a melhor imagem da diversidade cultural, ideológica e geográfica do ser humano. Gosta do humano. Interessa-se genuinamente pelos pensamentos e reflexões que nos fazem vivos.

Se qualquer espaço de uma casa, por mais inusitado que seja, pode ser utilizado pelos seus moradores, Nazareno reflete tal pensamento dentro da galeria paulistana, induzindo o expectador a observar cada canto do local, em buscas de pistas deixadas pelo artista. Pratos com digitais de amantes, azulejos gravados com palavras a serem reunidas em histórias ou até uma diminuta casa aninhada em um espaço inesperado, que nos remete a um cofre repleto de confissões.

O universo criativo do artista nos leva também a caminhar entre os devaneios elaborados ao redor desse elemento tão presente desde os contos de fadas à literatura adulta, por onde passam importantes descrições feitas por seus autores como forma de nos aproximar e nos conectar com os mais distintos personagens. De João e Maria a Orlando, passando por Barba Azul, a casa é cerne daquilo que somos e vivemos. Bem-vindos à atual casa de Nazareno.

Ana Carolina Ralston
curadora